“A opção pelo colectivo tem inúmeros fundamentos. O primeiro deles é o
facto de o cinema ser uma arte absolutamente colectiva, ao contrário de
inúmeras outras, como literatura, pintura, escultura, forjadas em
exercícios solitários”O título para esta coluna ocorreu-me ao
assistir a uma entrevista com o cineasta Manuel de Oliveira, há alguns
dias, num canal da tv brasileira.Nela, ele definia cinema com
esta frase simples, mas contundente: “ cinema é o espelho da vida”.
Possivelmente outros já o definiram de uma forma semelhante. Poucas
horas antes, eu havia dado uma entrevista para o programa de Celso
Domingos na STV, que este conclui dizendo o mesmo, embora com palavras
diferentes. No cinema, para além das vivências dos seus autores, se
reflete a vida de todos nós, o que os homens fizeram, fazem ou irão
fazer. É nisto que reside a força da mais recente das artes, que conjuga
realidade e ficção, que congrega teatro, literatura e música.A
coincidência destas definições, num mesmo dia, me emocionou e me fez
pensar com mais clareza no que devia constituir esta coluna sobre
cinema.A priori, estava acertado com os editores que seria um
trabalho colectivo, assumido por um grupo de cineastas moçambicanos com
uma história comum e pontos de vista convergentes, sobre a produção
nacional e alguma produção internacional. Trata-se de profissionais que
há trinta anos actuam juntos, com os seus nomes a compartilharem os
genéricos de inúmeros filmes.A opção pelo colectivo tem inúmeros
fundamentos. O primeiro deles é o facto de o cinema ser uma arte
absolutamente colectiva, ao contrário de inúmeras outras, como
literatura, pintura, escultura, forjadas em exercícios solitários. A
segunda, decorrente desta, é que se pode dar testemunhos diferentes
sobre uma mesma obra em que se participa, o que enriquece a coluna e
abre espaço para um debate criativo que tanta falta faz aqui, na nossa
área. Não havendo em Moçambique uma crítica especializada em cinema,
toda a menção a filmes produzidos aqui ou sobre as produções
internacionais, de valor social, cultural ou artístico, se resume a
pequenas notas na imprensa sobre os seus lançamentos ou entrevistas
genéricas com os realizadores locais a tocarem normalmente na desgastada
tecla das nossas dificuldades de cada dia.Nesta coluna não
pretendemos assumir o papel de críticos cinematográficos, para o qual
não estamos qualificados. Nos assumimos exclusivamente como cineastas do
Sul e vamos falar do nosso cinema, da sua história e dos novos filmes,
como cineastas envolvidos, como testemunhas, cronistas de “making off”.
Vamos falar das obras mas também do que não se vê no ecrã, daquilo que
faz parte de uma filmagem, acidentes, incidentes, por vezes cómicos e
até ridículos. Destas e de várias outras pequenas coisas que fazem de um
filme um “espelho da vida”.Em Moçambique, excepção para o que se
pode ver no Dockanema, tem-se pouco acesso actualizado às novas
produções internacionais de interesse, aquilo a que chamamos CINEMA, em
oposição às produções de carácter puramente comercial, nulas, que muitas
vezes degradam a essência do homem, associando-o a uma imagem de
violência e instintos básicos. No entanto, vamos trazer informações
sobre aquilo a que temos acesso em festivais internacionais, nos quais a
produção moçambicana ocupa um espaço cativo. E vamos ter a contribuição
de um integrante do “colectivo” baseado em Lisboa.
Isabel Noronha, a única cineasta moçambicana com uma produção regular e uma participação activa no cinema nacional faz parte do que se pode chamar de segunda geração do cinema moçambicano, pós-Kuxa-Kanema, mas que ainda deu os seus primeiros passos nos anos de ouro do INC. Fez uma pausa para se formar em Psicologia e voltou ao activo, já há alguns tempos, com a realização de documentários, docu-dramas, experiências de linguagem mista de documentário e animação que têm constituído algo novo no cenário nacional. Vai abordar estas “pesquisas” de linguagem para falar de questões sociais actuais e de um tipo de documentário marcado pela sua formação em Psicologia.Gabriel Mondlane, cronista total do nosso quotidiano cinematográfico, das “nossas insuficiências”. Começou no cinema de para quedas, a comemorar a Independência, e fincou, solidamente, os pés nesta terra de fantasia e realidade absoluta.
Camilo
de Sousa, antigo combatente da Luta de Libertação Nacional capturado
pelo cinema. Já vivia nele mesmo antes de ter entrado, também no fim dos
anos setenta. Vai debruçar-se sobre memória, cinema e realidade,
análises sobre os “filmes da periferia”.Luis Carlos Patraquim, o
poeta do cinema nacional, escritor e narrador dos anos verdes,
rapidamente amadurecidos, da aventura comum: os nossos olhos e corações
no Norte, com incursões no cinema nacional.Por último, quem
assina esta nossa primeira colaboração sobre cinema no “O Pais Fim de
Semana”, já apresentado previamente pelos seus filmes, para quem os viu.
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