Ivan
Mazuze, saxofonista moçambicana a viver na Noruega, não tem dúvidas: os
escritores, pintores e atletas são os maiores e principais embaixadores
culturais do país, porque, com o seu poder da representatividade, conseguem
enaltecer a imagem de Moçambique. Nesta entrevista, Mazuze sintetiza a essência
dos seus três álbuns (Ubuntu, Ndzunti, Maganda) e dos seus universos
interiores, sem disfarçar a vontade de conquistar o mundo, por via da música.
É um artista do
jazz, que faz do saxofone sua língua. Como é exprimir-se por via deste
instrumento?
Para mim, o saxofone é a extensão
do meu corpo para poder exprimir os meus sentimentos.
Quem lhe escuta,
por exemplo, no seu último CD, Ubuntu (2015), sabe que canta a
sua terra em “Inta Mutlhangela”. É uma forma de se sentir em casa?
Definitivamente, não só, mas também
é uma forma de contar a minha história, origem e apresentar-me como africano e
moçambicano.
Compõe a pensar
na gente do seu país ou apenas preocupa-lhe ser um cidadão do mundo?
Componho baseando-me nas minhas
vivências, lugares em que passo, literatura, acontecimentos históricos,
tradição, pessoas influentes na minha vida ou experiência artística.
Como músico, tem
preocupações de desafiar o seu público a experimentar uma dor fictícia, quando,
por exemplo, toca “My Two Northern Lights” e “Talking to Myself” (Ubuntu), músicas
taciturnas e melancólicas?
Sim, adoro melancolia como uma
forma alternativa de expressão musical.
Ao mesmo tempo
que o CD nos desafia a uma meditação, também consegue nos pôr num modo
eufórico. São os casos de “Hamba Kahle” e “Dancing with Malala”. As suas
músicas traduzem o estado de espírito em que se encontra a compor?
Sim, como africano tenho este lado
eufórico com muita felicidade, dançante e expressivo. Acho natural para mim.
Ubuntué um CD com 53
minutos. O que mais lhe interessou transmitir nesse tempo?
Interessou-me transmitir uma
mensagem do modernismo urbano africano.
Todos os seus
álbuns têm uma música que os intitula. Há uma explicação?
Cada uma das musicas que intitula o
álbum mostra uma assinatura performativa e conceptual de cada álbum em geral.
Às vezes lhe
escuto e fico com a sensação de que as suas músicas deixam de exprimir muita
coisa. Por exemplo, “Celina” e “Mosambik” (Ndzunti, 2012) ou
“Felicidade” (Maganda, 2009). O que fica por dizer, depois da música ficar
pronta?
Pois… de certa forma, alguns
elementos inspiram-me a compor um determinado ritmo ou som. Por exemplo, a
música “Celina”, a entoação e ritmo foram inspiradas pela minha querida avó,
uma pessoa influente na minha vida. “Mosambik” é alegria natural do moçambicano
em geral, a nossa forma de dançar. “Felicidade” é inspirada por uma das pessoas
mais influentes da minha vida: a minha mama. Quando criança, dançava muito com
a minha própria mãe e esta vivência influenciou-me a compor.
“Pé descalço”
lembra-me um título de Casimiro Nhussi, “Sem sapato”. É uma condição de vida em
causa?
Uma condição de humildade perante
os desfavorecidos.
O que lhe dá
tanto gozo quando toca o universo que tem dentro de si?
Finalmente consigo exprimir-me,
exercendo a actividade pela qual tenho a maior paixão na vida.
No seu primeiro
álbum, Maganda, encontramos um
tema curioso: “Piece of Peace”. É a demonstração de um desejo?
Realmente, procurando um pedaço de
paz pelo qual possa trazer harmonia e tolerância no nosso universo.
Se colocasse a
questão nos seguinte termos: tocar é uma forma de voltar a casa ou de
conquistar o mundo, o que diria?
De conquistar o mundo, pois o mundo
das artes performativas deseja, de certa forma, uma contribuição única de novas
tradições.
Há dois temas de Maganda que me despertam
muito interesse: “Inkomo tatana” e “Shangana tsonga”. Quais são as estórias
destas músicas?
“Inkomo Tatana” foi escrito e
dedicado ao meu pai como guia/embaixador do fundamento da minha carreira
académica, tornando-se, assim, um visionário no meu ponto de vista. “Shangana
Tsonga” é dedicado ao meu grupo étnico, changanas, uma mistura dos povos Nguni,
sul-africanos e locais Tsongas, do Sul de Moçambique.
Quais são as
áreas de estudo que lhe interessam na sua área académica?
Música tradicional na religião
Africana, especificamente em Moçambique e África do Sul.
Que perde e
ganha por estar a fazer música fora do seu país?
Perco o diário consumo da nossa
linda música tradicional. Ganho uma enorme experiência e conhecimento sobre a
indústria internacional e acesso a diversas e interessantes tradições pelo
mundo fora.
Moçambique tem
grandes nomes do afro jazz e de outros estilos no estrangeiro. Acha que
conseguem comunicar?
Sim, com certeza. Nos meus vários
projectos e bandas já contribuíram alguns influentes músicos moçambicanos, como
Childo Tomás, Deodato Siquir, Isildo Novela e mais.
E essa
representação no estrangeiro consegue enaltecer a imagem do país?
Com certeza! Os maiores e
principais embaixadores culturais do pais são os artistas, escritores, pintores
e atletas.
O que lhe falta
tocar sobre o seu país?
Muito, pois o nosso país é rico e
muito diversificado culturalmente e linguisticamente, que há tanto que explorar
ainda.
Perfil
Ivan Mazuze é saxofonista, compositor e
membro do Conselho para Representante Oficial de Música e Dança Folclórico
Internacional e Nacional na Noruega. Igualmente, é líder artístico para o
Førdefestivalen, Festival de música tradicional e músicas do mundo;
Representante e Embaixador Cultural para Noruega na Diáspora do Género World
Jazz através das Organizações Music Norway, Arts Council Norway e Forum de Jazz
da Noruega.